



CAROLINA MARIA DE JESUS
Dia 14 de março de 2020 se completam 106 anos do nascimento de Carolina Maria de Jesus. Deixo aqui minha homenagem a essa mulher que me ajuda a entender melhor o Brasil e a acreditar na força e na beleza da literatura.


Carolina Maria de Jesus autgrafando seu livro Quarto de Despejo em 1960.
Sobre Carolina
Os leitores da década de 1960/70 devem se lembrar de Quarto de Despejo, o super best-seller escrito por Carolina Maria de Jesus. Ela era mulher, negra e pobre, mas foi contra todas as estatísticas e conseguiu vender mais de um milhão de cópias do livro em que contou o cotidiano da vida que levava na extinta favela do Canindé, na zona norte de São Paulo.
Mesmo tendo estudado apenas até o segundo ano do primário, Carolina gastava o tempinho que lhe sobrava quando não estava cuidando dos filhos ou catando sucata lendo e escrevendo em diários. Diários que, aliás, usava como válvula de escape, trampolim (pois sempre teve a intenção de publicá-los) e arma. Vocês acreditam que ela ameaçava vizinhos e afins dizendo que iria expô-los em seus livros se eles continuassem fazendo papelão?
E foi dessa forma que a até então aspirante conheceu o jornalista Audálio Dantas. Ele estava fazendo alguma reportagem na favela e a encontrou batendo boca com os moradores, dizendo que iria colocá-los nos diários. Audálio ficou interessado e, pronto, em 1959 conseguiu publicar um texto de Carolina na revista O Cruzeiro. Mais alguns meses e Quarto do Despejo foi publicado.
Com o sucesso instantâneo (acho que era a primeira vez que o Brasil via uma negra da favela falando por si), Carolina conheceu Clarice Lispector (que estava no lançamento do livro!), mudou-se da favela que tanto odiava e viajou em eventos literários pelo mundo. Só que suas obras lançadas a partir daí não deram muito certo, e a escritora foi esquecida. Morreu em 1977, aos 62 anos, no sítio que comprou na zona sul de São Paulo.

A escritora Clarice Lispector Com Carolina Maria de Jesus
Vídeos


Como o reconhecimento costuma vir quando o escritor já não está mais aqui, em 2014, Carolina recebeu muitas homenagens em virtude de seu centenário. Na ocasião, sua filha, a Vera Eunice que aparece tanto nos diários e hoje é professora, deu algumas entrevistas relembrando a mãe.
A escritora brasileira Carolina Maria de Jesus completaria 105 anos no dia 14 de março de 2019. Dada a riqueza de sua produção, a autora de 'Quarto de despejo: diário de uma favelada' é revisitada sob diversos ângulos e instiga pesquisas. Por ocasião dos 55 anos de publicação de seu livro de estreia a FAPESP produziiu um vídeo sobre aspectos de sua vida e obra, que agora relembramos.
Foi lançada recentemente a biografia oficial da escritora Carolina Maria de Jesus, falecida há quase quarenta anos. Mas, se você não a conhece, não está sozinho. Foi justamente a pouca popularidade dessa mulher, pobre, negra, que usou a vida na favela de inspiração para escrever, que motivou os autores a fazerem o livro.

A REPORTAGEM QUE REVELOU CAROLINA
Revista 'O Cruzeiro' de 1959
Reportagem do jornalista Audálio Dantas

A REPORTAGEM QUE REVELOU CAROLINA
A REPORTAGEM QUE REVELOU CAROLINA
Com a capa estampando uma moça branca de biquíni, a revista O Cruzeiro de 20 de junho de 1959 parecia como outra qualquer de uma das publicações ilustradas mais vendidas do Brasil, pertencente ao império monopolista de Assis Chateaubriand. Porém dentro daquela edição de número 36, havia uma matéria com uma escritora até então desconhecida. “Retrato da favela no diário de Carolina”, assinada por Audálio Dantas, apresentava a seus leitores a mineira Carolina Maria de Jesus, moradora da rua A, número 9, da antiga favela do Canindé, de São Paulo.
Conforme conta o jornalista alagoano, ele a encontrou durante uma pauta pelo jornal Folha da Noite em 1958 sobre o cotidiano na favela que beirava o rio Tietê. Passeando no terceiro dia de apuração, viu uns homens usando brinquedos que a prefeitura tinha instalado no local quando a voz indignada de Carolina ralhando com os marmanjos chegou aos ouvidos: “se vocês continuarem a fazer isto vou colocar todos os nomes de vocês no meu livro!”. Dantas foi até ela e perguntou sobre o tal livro, no que Carolina o convidou para ir até sua casa de madeira e ver os cadernos com os escritos. Admirado com o que leu, publicou sobre o achado no jornal de 9 de maio de 1958.

O material então foi editado por Audálio, que procurou manter o estilo da autora, e virou o mundialmente conhecido “Quarto de Despejo: Diário de uma favelada“, lançado em agôsto de 1960 pela livraria Francisco Alves (Editora Paulo Azevedo Ltda.) com capa e ilustrações de Cyro Del Nero. Na metáfora certeira de Carolina, decorrente da especulação imobiliária, a favela é o quarto de despejo de uma cidade, com as “coisas” a serem jogadas “fora”, e a parte central é a sala de visita. Ela se perguntava na página 71: “eu não saio do quarto de despejo, o que posso saber o que se passa na sala de visita?”.
A visão crítica dela se mostra desde o começo, como na abertura do livro: “15 DE JULHO DE 1955 Aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos generos alimenticios nos impede a realização dos nossos desejos. Atualmente somos escravos do custo de vida. Eu achei um par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela calçar”. As condições de vida melhoraram depois do lançamento, ainda que por pouco tempo já que ela morreu pobre em 1977 aos 62 anos. Todavia, sua voz e questões ainda reverberam no sistema que a excluiu.
O que me surpreendeu ao pesquisar essa revista foi a matéria de sete páginas que saiu publicada um ano depois do primeiro encontro de Audálio e Carolina. Fiquei curioso sobre a reportagem e a encontrei no arquivo que está disponível no site da Fundação Biblioteca Nacional – foi de lá que tirei as imagens e trouxe pra cá, podendo o texto ser lido abaixo. Nele, Audálio descrevia com fotografias o dia-a-dia da mãe de três filhos, o trabalho de Carolina como recicladora e comentava os trechos do diário, seguido de uma seleção destes. Faço a mesma coisa aqui praticamente e vou publicar em breve mais digitalizações da revista, tentando comentar outros desdobramentos na vida de Carolina.


Carolina de Jesus e Audálio Dantas: o jornalista descobriu e firmou a reputação da escritora

No dia 14 de março 2014, o IMS Rio comemorou o centenário de nascimento da escritora Carolina de Jesus (1914-1977), conhecida por "Quarto de despejo", lançado em 1960, com o evento "Carolina é 100", incluindo debate com Audálio Dantas e Marisa Lajolo. Veja o acervo da escritora no IMS: www.carolinadejesus.ims.com.br Durante o evento, foi apresentado o documentário "Favela: a vida na pobreza" (Favela - Das Leben in Armut), dirigido pela alemã Christa Gottmann-Elter em 1971 e até então inédito no Brasil. O filme foi restaurado e legendado em português pelo IMS. Após a exibição do documentário, aconteceu um debate com a participação do jornalista Audálio Dantas, descobridor de Carolina de Jesus e compilador de "Quarto de despejo", e da professora e crítica literária Marisa Lajolo, que já se deteve sobre a poesia de Carolina. O IMS disponibiliza aqui o debate ocorrido durante o evento "Carolina é 100" na íntegra.