
Raduan Nassar
RADUAN NASSAR
APRESENTAÇÃO

Profª Ver Lúcia Lopes Dias
“... rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver com o tempo, aproximando-se dele com ternura, não contrariando suas disposições, não se rebelando contra o seu curso, não irritando sua corrente, estando aberto para o seu fluxo, brindando-o antes com sabedoria para receber dele os favores e não a sua ira; o equilíbrio da vida depende essencialmente deste bem supremo, e quem souber com acerto a quantidade de vagar, ou a de espera, que se deve pôr nas coisas, não corre nunca o risco, ao buscar por elas, de defrontar-se com o que não é.”
- Raduan Nassar, no livro "Lavoura arcaica". Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.
"Toda ordem traz uma semente de desordem, a clareza, uma semente de obscuridade, não é por outro motivo que falo como falo."
- Raduan Nassar, no livro "Lavoura arcaica". Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.
O tempo é o maior tesouro de que um homem pode dispor; embora inconsumível, o tempo é o nosso melhor alimento; sem medida que o conheça, o tempo é contudo nosso bem de maior grandeza; não tem começo, não tem fim; [...]”
- Raduan Nassar, no livro "Lavoura arcaica". 2ª ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982, p. 45.
Comecei a me familiarizar com a obra de Raduan Nassar e sua Lavoura arcaica, muito antes de entrar para a universidade na minha graduação em Letras. Lembro-me claramente que estava no último ano do antigo segundo grau do Instituto Menino Jesus e no começo não consegui compreender muita coisa do livro, embora minha professora, D. Maria Leal Schimidt, insistisse que eu o lesse. Li por obrigação e pelo entusiasmo que ela me transmitiu. Mas confesso que não gostei muito no início para falar honestamente. Com apenas quinze anos ainda não possuía n época a vivência e os conhecimentos que pudesse me descortinar a beleza do texto. Somente quando entrei na universidade e comecei meu curso de Letras é que comecei a apreender e me encantar pela multiplicidade de sentidos e leituras que este livro permitia. Lavoura Arcaica se tornou para mim então um excelente livro. Talvez esse livro seja escultura. Penso que ele não foi escrito. Ele foi esculpido. O cuidado que o escritor teve em cada frase me recordou o estilo de outro que muito aprecio e estudei, Graciliano Ramos que também era cuidadoso com o uso das palavras. Raduan faz uso de um portugues sofisticado e de estruturas complexas, o que torna a leitura dessa obra algo desafiador mas extremamente saboroso. As frases nao sao apenas lidas. São vistas. São digeridas.
É interessante citar aqui o fato que Raduam tem até hoje apenas três livros publicados : Lavoura Arcaica, Menina Caminho e Um Copo de Cólera. No entanto com apenas esses três é um dos principais nomes do meio literário brasileiro, é considerado pela crítica literatura brasileira, como Clarice Lispector e Guimarães Rosa. Teve suas obras publicadas na Alemanha, França e Espanha. Se consultarmos os acervos digitais dos bancos de teses e dissertações das principais universidades do país, encontraremos uma grande quantidade de trabalhos de pesquisa que giram em torno da obra de Raduan, o que para mim não constitui surpresa. A surpresa maior par mim foi tomar conhecimento na época do motivo do afastamento do escritor da Literatura.
Como todos sabem, Raduan Nassar, que atualmente tem 84 anos, foi honrado com a premiação literária mais importante da língua portuguesa, o Prêmio Camões de literatura em 2016, concedeu uma rara entrevista e extensa entrevista do ex-escritor em 1996 para a série Cadernos de Literatura Brasileira do Instituto Moreira Salles (IMS) . Nessa entrevista, que li com surpresa e emoção, comecei a compreender as razões desse seu exílio voluntário.
As frases abaixo, que retirei da entrevista cuja íntegra se encontra no blog do IMS (clique aqui para ler na íntegra) fornecerão ao leitor desse site uma visão precisa. Elas contêm um mosaico de opiniões sobre o fazer literário do escritor, a sua aversão à rotina burocrática e as formas de controle da individualidade o que ajuda a explicar os motivos que o levaram a se afastar.
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“Valorizo livros que transmitam a vibração da vida, só que a vida nesses livros, por melhores que esses livros sejam, será sempre a vida percebida pelo olhar do outro.”
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“Qualquer autor isolado é sempre muito pequeno perto da complexidade infinita da vida.”
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“A chamada modernidade no sistema de produção, com sua ênfase na eficiência, esmaga certas manifestações de humanismo, incluindo-se nesse humanismo o delírio de alguns.”
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“Certos escritores vinham há tempos chupando o sangue das palavras, queriam a qualquer custo acabar com os sentimentos na literatura.”
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“Acho que a literatura perdeu certa ingenuidade (…) Em literatura, quando você lê um texto que não toca o coração, é que alguma coisa está indo pras cucuias.”
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“A dificuldade para entender certos procedimentos transplantados para a literatura, quando se recorre inclusive a cálculos de raiz quadrada.”
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“Como o mundo não começa e termina na literatura, arrisco dizer que estou em diálogo com meu tempo, só que no terreno da agricultura.”
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“Se digo o que penso, vou ser condenado como escritor ad aeternitatem; se não digo o que penso, eu mesmo vou me condenar ad aeternitatem.”
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“Nunca senti muito apego pelos livros. Os livros que me sobraram estão esquecidos lá nas prateleiras, me pergunto sempre que é que estão fazendo nas estantes.”
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“Se tivesse de me pautar pela leitura de manifestos literários, eu jamais teria escrito uma linha.”
De qualquer forma penso que essas obras de Raduan serão perenes e deixaram marcas na nossa literatura e serão sempre fonte inesgotável de pesquisas e admiração por milhares de gerações no futuro. Espero que esse site ajude a meus alunos, seguidores e amigos a conhecer e se encantarem ainda mais com elas.
Boa leitura a todos !

