

ANÁLISE DA PROFº VERA DIAS
União de Gigantes

O livro "Machado" pode ser considerado a união de dois talentosos gigantes : dois escritores que reuniram o melhor de sua arte e vida para produzir uma obra-prima que representa um legado para o futuro.
Esse romance foi lançado pela editora Companhia das Letras) sendo escolhido como livro do ano de ficção na disputa promovida pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) e Silviano foi o principal ganhador do 59º Prêmio Jabuti de 2017. (clique aqui para detalhes sobre a cerimônia de entrega)
No começo, o leitor pode ficar contuso com o novo romance de Silviano Santiago. Embora a capa de "Machado", com um lindo tom rosado que tomei emprestado para o design desse site, diga tratar-se de um romance, ao longo da leitura tive muitas vezes a sensação de que a narrativa desaparecia e dava lugar a um ensaio crítico e biográfico. Isso durava até a página seguinte, quando a voz do narrador retornava para sumir novamente logo adiante.
Neste livro, Sílviano conta - e reflete sobre - os últimos anos de Machado de Assis, de 1905 a 1908.0 autor apresenta, assim, um Bruxo do Cosme Velho sofrendo com a morte de Carolina, sua mulher, e com a epilepsia.
Observei que Silviano realizou para a confecção de sua obra uma extensa pesquisa biográfica factual e ao pesquisar em entrevistas e análises críticas existentes em revistas literárias especializadas, descobri o porquê dele resolver escrever um romance e não um ensaio crítico como poderíamos supor na leitura das primeiras páginas. Ele assim declarou numa entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em 13/12/2016, por ocasião de seu lançamento :
"Queria trabalhar com hipóteses. Na epígrafe de Sartre [o filósofo], ele diz que trabalha com hipóteses [no seu livro 'O Idiota da Família', biografia de Flaubert]. Muita gente acha que liberdade é só a ficção", declarou.
Neste livro, ele - um dos maiores críticos literários em atividade no país - volta a temas de um de seus romances anteriores, "Mil Rosas Roubadas" cujos temas eram a biografia, a autobiografia, a viuvez, os sobreviventes.
Segundo declarou na entrevista à Folha, um dos grandes romances de Machado e o menos lido era 'Memorial de Aires', que foi o seu primeiro interesse. O segundo era o que ele chamou de romance de sobrevida. O século 18 ,na análise do escritor, foi constituido pelo romance de formação. O século 21 que vivemos agora são para ele essas pessoas que conseguiram sobreviver.
Outro elemento que reforça o lado não ficcional desse livro é a pesquisa minuciosa executada por SIlviano reconstruindo a vida do biografado e a cena literária da época.
Por tudo que li e analisei até agora, cheguei à conclusão que essa obra é altamente recomendável para a leitura dos estudantes universitários da área de Letras. "Machado" é um livro de profunda erudição - o que pode torná-lo difícil em alguns momentos pois exige que se faça um exercício de profunda reflexão em alguns trechos, mas vale a pena. Para mim, ele fica como uma espécie de herança deixada por seu autor.
E a melhor definição do seu significado foi dado pelo próprio escritor no seu comentário ao final da entrevista :
"Não sentei e escrevi. É um livro que eu já tinha comigo. Ele fica como legado de uma certa erudição que eu possa ter. Um legado à literatura brasileira e, em especial, à sua figura maior, que é Machado".





Literatura como antropofagia em
Silviano Santiago: anotações sobre
um percurso ficcional até o romance
Machado


